Capítulo 2:
Foi simples passar pelos portões da cidade usando a armadura de guardas.
- Temos que nos livrar dessas roupas agora, ou seremos um alvo bastante visado nas estradas. - Disse Rapir.
- Eu tenho uma ideia melhor. - Code respondeu - Vamos passar pela floresta, a mata densa não deve ter bandido algum e, além disso, eu conheço bem as trilhas, nós cortamos caminho e economizamos tempo. Passando por ela há uma baía, aonde uma grande ponte, leva-nos perto da nossa primeira parada, a província mais próxima: Teros, aonde conseguiremos roupas mais discretas e talvez até alguns cavalos, quem sabe...
De fato Code conhecia bem aquela região, ele estava acostumado a caçar fora dos limites da cidade. Com suas flechas ele matava javalis, porcos selvagens, cervos e qualquer outro animal que poderia lhe valer algum dinheiro. Vendia o couro, pele, chifres, presas e ossos para a confecção de roupas, adornos e outros fins, além de carnes exóticas para nobres afrescalhados. Penas de gansos também eram úteis para a confecção das próprias flechas.
Porém Code não fazia ideia dos perigos que a noite poderia trazer.
A lua brilhava e o céu estava limpo, era uma bela e iluminada noite, mas para melhorar a luminosidade fraca dentro da floresta o herege sangrou uma grande árvore com a espada roubada e com a seiva desenhou inscrições na ponta de um pedaço de madeira, proferindo palavras mágicas incompreensíveis. Após isso raspou de leve o pedaço de madeira na grande árvore, aquela fagulha gerada foi o suficiente para gerar uma pequena chama. Completando a tocha improvisada, disse:
- Podemos ir agora.
Code ainda se recuperando do que acabara de ver, tomou a dianteira, guiando o grupo mata à dentro, aquele homem era de fato conhecedor de rituais místicos. Em silêncio, para não incomodar os animais que ali poderiam estar, e sempre atentos, os quatro seguiram caminho.
A floresta era em geral animais de pequeno porte que dormiam, apenas algumas corujas pareciam observar os viajantes e alguns morcegos davam rasantes, mais interessados nas árvores frutíferas do que nos estranhos.
Poucas horas de caminhada depois, chegaram ao extremo da planície, onde a floresta subia pela montanha e ali perto havia uma área aonde não haviam árvores e somente capim alto. Code sabia que já estavam perto da baía.
À esquerda havia uma fenda na base da montanha, uma pequena rachadura que formava uma caverna e Herege, olhando para a escuridão ali dentro teve um calafrio, sentia ali uma presença maligna. Olhou a lua cheia, calculou pela posição que já deveria estar de madrugada.
Os quatro ouviram sons provenientes de dentro da pequena gruta, e se esconderam. Corujas levantaram voo, roedores passaram correndo entre eles, e até mesmo os morcegos voaram para longe. Estabeleceram uma distância segura e observaram. Com um movimento, o herege apagou a tocha, e Code botou a corda no arco, fincou três flechas no chão de terra e uma no arco, pronta para ser disparada.
Os estranhos ruídos cessaram e então houve uma calmaria.
Code reparou pegadas gigantes e um rastro de sangue, ainda frescos, que rumavam em direção à caverna.
- Devemos ir la dar uma olhada? - sussurrou.
- Melhor ficarmos de olho aqui. - Argumentou o Rato. - Pode ser que os bandidos estejam se escondendo nessa caverna.
- Façam silêncio! - Ordenou o Herege.
Nesse momento, ouviram passos, de dentro da caverna, ficando cada vez mais altos, o que quer que estivesse ali dentro era grande e estava saindo. Os quatro viram sair das trevas, uma mão, grande e peluda, exibia garras, e segurando a parede da montanha, trouxe à tona o resto da criatura. Possuía forma humanoide, media aproximadamente três metros de altura e era meio homem e meio lobo. Emitiu um alto uivo em direção à lua cheia, como que um tributo.
Os quatro ficaram paralisados, frente aquela cena. Então os boatos da cidade estavam certos, havia realmente um monstro assolando a população.
Saindo do transe momentâneo de pavor, Code disse em volume quase inaudível à herege:
- Esse é um bom momento para um de seus truques.
O lobo virou-se em direção à eles e rugiu, os sentidos aguçados captaram a presença deles ali. E em fúria avançou, fitando uma silueta em meio a escuridão da floresta, ao contato de suas garras o feitiço se desfez, e a bela moça que seria retalhada alguns metros a frente dos quatro desapareceu no ar, com a fúria do ataque o gigante foi ao chão.
Um rápido momento de confusão foi o suficiente, Rato e Rapir avançaram, sacando suas espadas, porém a fera era arisca e logo se recuperou da queda, pronto para atacar a dupla que corria em direção a ele.
Code puxou a corda o máximo e soltou, liberando a flecha que percorreu o campo, passando como um raio pelos que avançavam e, não fosse os rápidos reflexos do monstro atingiria em cheio sua cabeça, que desviou para baixo no último momento, fazendo a flecha passar e perder-se dentro da escuridão da caverna uma fração de segundo depois.
Code xingou e tirou a segunda flecha, que estava cravada no chão, botando-a no arco, preparado para um segundo tiro. Foi ai que viu o Herege, fazendo símbolos com a mão, para a fraca sombra que se projetava, o negro da sua pupila tomou todo o globo ocular. Olhando para frente viu que os dois já estavam muito perto do Homem-Lobo, que preparava um golpe mortal com as garras. Os dois eram bravos, mas não tinham chances contra aquela máquina de matar. Achou que era um bom plano, que a distração ia dar tempo suficiente para atacarem enquanto o inimigo estivesse atordoado, subestimou o monstro e agora seus amigos pagariam pelo erro.
E logo depois percebeu que o monstro estava paralisado, não conseguiu abaixar a mão para desferir o golpe com as garras. Havia um tentáculo negro que se projetava da escuridão da própria sombra do herege e prendia a mão do monstro. Foi o tempo suficiente e com um grito, Rapir cravou a espada curta na barriga do monstro, que rugiu forte e se debateu, arremessando-o contra o chão e seu elmo frouxo foi lançado longe, deixando à mostra sua completa falta de cabelo.
Com uma demonstração de agilidade, Rato que corria logo atrás se jogou ao chão deslizando pela grama, esquivando-se do ataque com o braço livre do lobo, passou entre as pernas, erguendo-se atrás do inimigo. O pequeno ladino saltou, e impulsionando-se na parte de trás da pata do monstro pulou de novo, para atingir a altura das costas, fazendo um rasgo em diagonal com a espada enquanto estava na descendente do salto, provocando um novo rugido de dor.
Code ficou impressionado, estavam levando vantagem na luta. Ao seu lado Herege arfava, e seu rosto estava coberto de suor. Fitou novamente o monstro, dessa vez não podia errar, puxou a corda ao máximo, mirou e soltou a flecha. Dessa vez o alvo era o peito, exatamente onde a flecha se fincou, com uma violência absurda, fazendo o grande corpo pesar no tentáculo. O Herege desfaleceu e o tentáculo fraquejou, liberando o peso do monstro, que já muito ferido, nem esboçou reação.
Levantando-se, Rapir segurou a espada, ainda fincada no lupino, deslizou-a com força na horizontal e depois puxou com força, fazendo o sangue espirrar.
Tudo aconteceu muito rápido. E quando se deram conta o lobisomem tombou.
Estava jogado no chão, completamente sem vida.
- O que diabos foi isso? - Rapir ainda não acreditava no que vira.
- Provavelmente o monstro que o Capitão Kuri disse. Agora ele me parece bem real. - Code aproximou-se levando o herege no ombro, estava desmaiado, mas sentia o coração batendo. - Provavelmente o feitiço tenha consumido muita energia. – Arriscou leigo. - Teremos que carregá-lo, mas já estamos chegando perto da ponte.
- Nem acredito que matamos essa coisa! - O Rato disse enquanto limpava a lâmina da espada.
- Antes de partirmos melhor coletarmos o que presta dele. - Disse Code, tirando a corda do arco.
Arrancaram as garras, alguns dentes, pelos e um pouco do sangue. Acharam que poderia ser útil para algum pesquisador, até para o próprio herege talvez.
- Será que tem mais coisas dessas por ai? - Rato temia pela resposta positiva.
- Realmente não sei. Mas o padrão de pegadas mostra que havia apenas uma criatura por aqui. - Deduziu Code.
E estava correto, naquela floresta o monstro reinava absoluto, era um lobo solitário.
Rapir pegou seu elmo e colocou-o novamente na cabeça. Não a fim de esconder a careca, mas por mera proteção.
- Sou de uma família nobre, da cidade de Tiba, - revelou - fui achado ainda criança e adotado. Minha mãe era estéril, e ela era temente aos deuses. Achava que isso era punição por algum pecado cometido pelos seus antecedentes. Cresci em meio à nobreza, e meu pai queria que eu estudasse e me graduasse, mas eu nunca gostei dessa vida política e diplomática. Quando atingi a maioridade perdi todos os meus cabelos. O cabelo entre os nobres é sinal de status e minha mãe insistia que era uma maldição dos deuses pelas minhas rebeldias, mas eu não acredito nessas besteiras e até gostei do meu novo visual. Sempre gostei mais da luta, de cavaleiros e conquistas. Então, motivado a viver vida nova, eu parti, deixando a minha cidade natal para trás, e rumei para Oir. O resto vocês já sabem.
Rapir contava, enquanto caminhavam. Por ser o mais forte levava o homem que conhecia apenas como O Herege no ombro. Andava com homens que conhecera à apenas algumas horas, mas já confiava neles o suficiente para contar-lhes os seus maiores segredos. E ficou feliz, esse era o verdadeiro laço da amizade, que nunca experimentara durante a vida como nobre, cercado de intrigas e bajuladores, mas ali, entre foras da lei.
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Postado por LubaLuba às 16:39
Marcadores: Bêbados Leitores
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