
Eu adoro mitologia grega. Desde quando fui apresentado ao tema ("Cavaleiros do Zodíaco", minha infância =D) procuro ler os mitos e ter acesso as obras que tem por base esta rica cultura (não são poucas:"Tróia","300","Percy Jackson e o Ladrão de Raios"... apenas para citar as mais recentes). Assim, quando soube que iriam fazer o remake de "Fúria de Titãs" não pensei duas vezes em conferir o resultado no cinema. E devo dizer que fui preparado para eventuais mudanças na história em relação ao que consta na mitologia, afinal é um trabalho de adaptação. Mas nada me prepararia para a decepção de que, além de cometerem um verdadeiro atentado à mitologia grega, os realizadores deste longa ainda entregam um filme de qualidade risível.
Contando fatos ligeiramente inspirados pela lenda de Perseu e a Medusa, o filme inventa como mote principal para sua história uma revolta dos homens de Argos aos deuses, que dependem da adoração humana para "alimentar sua imortalidade" (outra invenção do filme). Aproveitando-se da situação, Hades (Ralph Fienes) leva seu irmão Zeus (Liam Neeson) a autorizá-lo a libertar no eclipse solar o terrível monstro Kraken para castigar a humanidade. Cabe agora ao semideus Perseu (Sam Worthington), filho de Zeus, decapitar a rainha das górgonas Medusa, cujo rosto é capaz de petrificar aqueles que olharem diretamente para ele. Esta será a única forma de derrotar o Kraken e salvar a princesa Andrômeda (Alexa Davalos), oferecida como sacrifício à besta.
Procurando dar ritmo ao filme, o diretor francês Louis Leterrier (O Incrível Hulk) jamais investe muito tempo no desenvolvimento de seus personagens, fazendo apenas o filme saltar de cena de ação em cena de ação. Isto se revela o principal defeito do longa, já que o expectador em momento nenhum é levado a se envolver pelos dramas de seus personagens. Assim, vemos o pai adotivo de Perseu encontrá-lo, criá-lo e ser morto junto com o resto da família em menos de 10 minutos de filme. Impossível sentir o peso da tragédia que se abate sobre o protagonista. O pior é que o roteiro parece perceber essa fragilidade, já que chega a incluir desnecessariamente uma "irmã mais nova", procurando dar maior peso dramático à perda. Não consegue.
E se algumas liberdades que o filme toma em relação ao mito original revelam-se acertadas, como a inclusão da subtrama de Andrômeda na história de forma bem mais orgânica, outras são completamente desnecessárias e algumas até mesmo comprometem a lógica da narrativa (o covil da Medusa tinha que ser no submundo, o QG do inimigo, com Perseu entrando e saindo e Hades nem sequer notando?). Afinal, é sintomático que o filme tente vestir Zeus e Hades, relegando o restante do Olimpo à condição de figurantes, com os valores judaico-cristãos de "deus amoroso criador da humanidade" e de "diabo". Subestimando a inteligência da platéia, o filme procura picotar a mitologia grega e moldá-la na dualidade "bem x mal" da cristã.
Sendo provavelmente o único grego a usar um corte de cabelo militar, Sam Worthington confere energia ao protagonista, mas é prejudicado pela falta de ligação emocional com o público. Alexa Davalos faz o que pode para encarnar o esteriótipo da princesa boazinha preocupada com o bem de todos, enquanto Gemma Arterton, inexpressiva como Io, está ali apenas para dar explicações apressadas sobre a história. E se Ralph Fienes se entrega à canastrice ao empregar uma irritante voz rouca e andar desajeitado à Lúcif... perdão, Hades, Liam Neeson está completamente perdido em relação às motivações de Zeus. Mas quem pode culpá-lo? Afinal, qual é a do Senhor do Olimpo? Ele está enfurecido com a humanidade, mas não hesita em ajudar o herói, ao mesmo tempo em que dá ouvidos ao seu irmão e liberta o Kraken (que não era pra ser propriedade de Poseidon???), mas é dito que "ama demais os homens". Hã??? Apesar de tudo, o veterano ator consegue conferir alguma dignidade ao personagem, tendo que superar até mesmo o ridículo de estar vestindo uma armadura super purpurinada que faria Lady Gaga se roer de inveja.
Em contrapartida, devo dizer que os efeitos visuais do filme são irrepreensíveis. As criaturas digitais são perfeitas e as cenas de ação são corretas. É uma pena que tamanha técnica tenha sido empregada em um longa de qualidade tão duvidosa.
Esperemos que da próxima vez a mitologia grega seja tratada com mais respeito.


3 comentários:
Esse filme certamente foi uma grande decepção. Jogaram fora o que podia ser um novo clássico épico!
Alguém viu o original?
Concordo com toda a crítica. Realmente lastimável e nem mesmo as cenas de ação são válidas, apenas mais do mesmo.
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